Como foi
o garimpo em Serra Pelada?
O maior garimpo a céu aberto do mundo chegou a
reunir mais de 100 mil pessoas atrás de pepitas de ouro no interior do Pará
Uma região com uma historia unica num país de politicos covardes e hesitantes. Uma historia fantastica ainda a ser contada e eternizada, tal o feito dos egípcios. Uma lenda a ser resgatada, há dívidas a serem pagas aos garimpeiros que ainda hoje esperam.
Foi um fenômeno da mineração que
ocorreu no Pará entre 1980 e 1992. Tudo começou quando uma pepita
de ouro foi encontrada na fazenda de Três Barras no final de 1979 (há
controvérsias sobre a data), atraindo, nos meses seguintes, mais de 30 mil
pessoas. A fazenda foi invadida pelos garimpeiros e passou a ser controlada pela
ditadura militar – o líder era Sebastião Rodrigues de Moura, o major Curió, que
tinha feito “fama” perseguindo guerrilheiros no Araguaia (em 1982, o major se
tornou deputado federal e, em 1988, deu nome a Curionópolis, onde oficialmente
está Serra Pelada). Munidos de pás e picaretas, os garimpeiros desterraram o
morro de 150 m de altura, deixando no lugar uma cratera de 24 mil m2
que se transformou num lago de 200 m de profundidade com a ação das chuvas.
Serra Pelada foi o maior garimpo a céu aberto do mundo, de onde foram extraídas
toneladas de ouro.
1. Após a
descoberta inicial, mais de 30 mil pessoas foram atrás do ouro. A Vale
do Rio Doce, que tinha direitos sobre a lavra, recebeu uma indenização do
governo pela perda da área, que foi invadida. Todo mundo devia vender o ouro
para os cofres federais, mas, na prática, o contrabando existia. A Vale
interditou a cava diversas vezes para mecanizar a exploração, mas os
garimpeiros voltavam para lá
2. No
garimpo, não era cada um por si. O terreno era dividido em “barrancos”
(pedaços de terra de 2 por 3 m), que foram conquistados à força no começo e,
depois, sorteados, contando inclusive com escritura. Os donos dos barrancos
eram os “capitalistas”, que tinham subordinados e ficavam com quase todo o
lucro. No auge, Serra Pelada tinha 300 barrancos
3. Logo
abaixo do capitalista estava o meia-praça, basicamente o cara que dizia
quem iria escavar onde. Por dar ordens, o meia-praça era a “classe média” do
garimpo – e, diferentemente dos outros, que eram assalariados, ganhava por
comissão. Ele recebia uma pequena porcentagem sobre o ouro encontrado (de 2 a
5%)
4. Os
outros empregados eram o cavador, o apontador, o apurador e o formiga. O
trabalho começava com este último: ele cavava o solo até encontrar rocha.
Depois, juntava até 35 kg dessa terra num saco, punha nas costas e o carregava
para fora da cava, subindo escadas improvisadas chamadas de “adeus-mamãe”. Seu
pagamento era proporcional ao peso levado
5. O
cavador era o empregado mais importante: orientado pelo meia-praça, ele
marretava a rocha com picaretas atrás de pepitas. Dependia-se muito da sorte,
pois não dava para saber se o barranco estava premiado ou não antes de
explorá-lo. Era frequente encontrar pepitas de ouro do tamanho de uma bola de
golfe
6. Em
seguida, ocorria a lavagem. Nessa parte, o apurador escorria a terra por
uma calha coberta de mercúrio líquido. A substância se unia ao ouro, formando
uma liga. A bateia (uma espécie de bandeja côncava de metal) era usada para
separar a liga da terra. Depois, esse mix era esquentado para evaporar o
mercúrio e sobrar só o ouro
7. Próximo
ao barranco existia um guichê da Caixa Econômica Federal. Pela lei, era
o único lugar onde os garimpeiros poderiam vender o minério extraído. Havia uma
balança para pesar o ouro e o pagamento era feito em dinheiro vivo. No entanto,
a Caixa estabelecia os preços, que eram até 60% abaixo do valor real das pedras
8. Na mina
eram proibidos álcool, armas e mulheres – havia policiais federais (os
“fedecas”) monitorando tudo. Diante das proibições na jazida, nasceu a Vila
Trinta, um vilarejo a 30 km de Serra Pelada, na rodovia PA-175, com bares e
muitos bordéis. Além da farra, a aldeia era lugar para aliviar as armas de
fogo. Entre brigas e acertos de contas, os assassinatos eram rotineiros
9. A fase
áurea foi entre 1982 e 1986, quando 100 mil pessoas se acotovelavam em
Curionópolis (hoje com 18 mil habitantes). O garimpo em Serra Pelada durou até
1992, quando o governo fechou a mina. Até o encerramento, 56 toneladas do
valioso metal foram arrancadas (incluindo aí a extração clandestina). Em 2002,
o garimpo voltou, mas de modo mecanizado
PERGUNTA DA
LEITORA – Thaís
Matias Pamplona de Oliveira, Ribeirão Preto, SP
CONSULTORIA Estêvão Barbosa, geógrafo e
pesquisador do núcleo Mineração e Desenvolvimento Sustentável da UFPA, Luiz
Jardim Wanderley, geógrafo e professor da UFRJ, Salvador Tavares de Moura,
historiador e professor da UFMA, Valdeci Monteiro dos Santos, economista e professor
da Universidade Católica de Pernambuco
FONTES Documentário Serra Pelada: A
Lenda da Montanha de Ouro, de Victor Lopes; filme Serra Pelada, de
Heitor Dhalia; livro Serra Pelada: Uma
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